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Salvando Katerina

Salvando Katerina


Salvando Katerina - Excerto Do Livro

Capítulo 1

“Você quer que eu faça o quê?” Christopher Bennet olhou para sua mãe, horrorizado.

Ela devolveu o olhar suavemente. “Não estou pedindo muito, filho. Ela é uma garota adorável, e eu só quero apresentá-los.”

Christopher revirou os olhos, desgostoso. Sua mãe era tão romântica, às vezes ela o deixava louco. Ele contou vagarosamente em silêncio, tentando não gritar com ela, seus olhos varrendo os arredores. Eles estavam fora da fábrica da família, uma estrutura de tijolos de vários andares com vagalhões de fumaça, que faziam arder os olhos, saindo de várias chaminés. Mesmo da rua, o barulho das caldeiras a vapor e o retinir do maquinário eram bem altos. Lá dentro era ensurdecedor. As ruas no entorno da fábrica era imundas de cinzas e fuligem e os prédios que os cercavam – cortiços onde as pessoas alugavam quartos – ficavam acomodados debaixo de uma camada de lixo e sujeira. O ar frio, úmido se agarrava a mãe e filho, de pé fora do imenso edifício, umedecendo a pele deles com um orvalho levemente mofado. Uma leve brisa soprava, mandando o frio diretamente através do seu casaco, que ele tinha jogado precipitadamente sobre os ombros e deixado desabotoado, e o xale dela, e ambos tremeram. Quando o vento passou pelo cortiço, trouxe um abjeto odor de dejetos humanos e corpos sem lavar. Era um lugar horrível para se viver, tão perto de uma fábrica, mas para os milhões de pobres de Londres, não havia escolha. Mas nenhuma dessas almas desesperadas trabalhava para os Bennet. Christopher e seu pai pagavam taxas muito altas para isso. Seus funcionários viviam muito confortavelmente, em comparação.

Uma criança pequena e magra sentou no degrau do outro lado da rua, vestida apenas com uma fina roupa de dormir, a despeito do frio cortante de Janeiro, brincando com algum pedaço não identificável de lixo. A cena não suavizou o gênio de Christopher, e quando ele falou, sua voz soou mais dura do que ele pretendia. “Mãe, eu sou muito jovem para você bancar a casamenteira comigo. Eu não estou nem perto de estar pronto para me casar.”

“Que vergonha,” Julia Bennet respondeu, afastando uma mecha de cabelo da testa e enfiando-a debaixo do seu chapéu. “Você tem vinte e quatro anos, a mesma idade que seu pai tinha quando nos casamos. Por favor, filho. Não estou pedindo que você se case com ela, apenas deixe-me apresentá-los.”

“Por quê?” insistiu Christopher.  

Desta vez Julia fez uma pausa. Ela detestava estar ali. Embora ela aprovasse o que seu marido e seu filho estavam fazendo nesta fábrica, ela detestava o calor, o barulho e a sujeira do lugar, isso para não falar seus pavorosos arredores. Cortiços como este são campo fértil para o cólera. Ela deu de ombros, desgostosa. Que diabos estou fazendo aqui? Mas ela sabia a resposta, embora ela ainda não quisesse explicar tudo. Ela tinha acabado de tomar chá com sua jovem amiga, e escutado a musicista tocar cravo – lindamente, como sempre – e então Julia viu algo tão... ela balançou a cabeça. Não era a primeira vez que ela via tais marcas na pobre garota, e Julia desejava afastá-la daquilo e mantê-la a salvo. Mas, ai dela, Kat era sua amiga, não sua filha, e ela não tinha direito de interferir. Hoje, porém, ela havia tido uma ideia. Havia uma forma de tornar Kat sua filha, para arrancá-la de perto daquele monstro. Era um plano impulsivo, repleto de um potencial desastre, mas, de qualquer forma, aqui estava ela. Ela tinha ido até a fábrica no momento em que a visita se fora. O táxi no qual ela tinha vindo estava esperando no meio-fio para levá-la para casa.

Christopher olhava para ela com expectativa. Mas o que dizer a ele? Algo verdadeiro... mas não toda a verdade. Ainda não. “Porque ela não é muito popular, e não há razão para isso. Eu quero que todos vejam que não há nada de errado com ela.”

“Por que você se importa?” perguntou ele.

Ela lançou a ele um olhar desaprovador, condenando seu sarcasmo, mas respondeu assim mesmo. “Ela é minha amiga.”

“Quantos anos tem essa mulher?” Ele estreitou os olhos, desconfiado.

Julia jogou as mãos para cima, num gesto que lembrou sua educação menos que distinta. “Não me olhe assim,” exclamou ela. A criança do outro lado da rua lhes lançou um olhar penetrante. Julia baixou a voz. “Katerina não é menor de idade. Ela tem dezenove anos, creio eu, e é muito bonita. Por favor, filho, você não pode fazer só isso por mim? Só conhecê-la?”  

Christopher sabia que era inútil recusar. Sua mãe era uma mulher muito doce, mas podia ser muito teimosa. Uma vez que ela tinha decidido que ele precisava conhecer sua amiga, ela não o deixaria em paz até que ele o fizesse. Melhor acabar logo com isso. “Ah, tudo bem, então,” ele concordou azedamente. “Acho que você pode fazer as apresentações esta noite. Eu vou conhecê-la. Embora eu não prometa dançar com ela. Se ela for algum tipo de pária...”

“Ah, não,” sua mãe respondeu rapidamente, fazendo outro de seus gestos irrefreáveis, “só um pouco tímida, uma flor solitária. Nada mais.”.

“Katerina de quê?”

“Valentino,” respondeu Julia. Os olhos dela o perfuraram, mas ele não reconheceu o nome.

“Italiana?” perguntou Christopher.

“O pai dela é,” explicou ela. “Katerina, até onde eu sei, viveu a vida toda na Inglaterra. Ela parece italiana, mas seus modos e jeito de falar são muito ingleses.”

“Entendi,” replicou Christopher. Por dentro, ele ainda se ressentia desta óbvia manipulação, mas manteve a voz neutra. “Ótimo. Hoje, no baile, eu vou permitir que você nos apresente, mas isso é tudo. Qualquer outra atitude minha será decidida por mim.”

“Eu entendo, filho.”

Christopher voltou para dentro, batendo a pesada porta de carvalho.  

Uma vez longe dele, Julia suspirou aliviada. Se ele ia conhecer Katerina, já era um começo. Algo tinha eu ser feito para ajudar aquela pobre garota com a qual ela se preocupava tanto, e Julia queria dar a ela todos os recursos, até mesmo seu primogênito, para conseguir. Ela só rezava para que fosse o bastante.

Capítulo 2

“Bennet, que bom que você pode vir.” Disse James Cary, um dos amigos de Christopher, estendendo uma taça de conhaque.

“Claro, claro, Cary. O que você esperava? Minha mãe queria falar comigo.” Christopher revirou os olhos, aceitando a taça com gratidão, e bebeu. Ele afundou num sofá de madeira entalhada com encosto alto e estofamento de veludo azul, o melhor assento na casinha de tijolos amarelos fornecida a Cary como parte de seu pagamento como vigário na capela de uma pequena vizinhança de classe trabalhadora. O salário de Cary era adequado às suas necessidades, mas seus gostos eram austeros e seus interesses obscuros. Ele preferia gastar sua renda extra num livro de poesia e numa garrafa de vinho caro para apreciá-los do que em enfeites, então sua sala era decorada simplesmente com um tapete oriental azul e preto esfarrapado no chão, onde descansava uma mesa de mogno onde ele arrumou sua coleção premiada de garrafas de vidro com chumbo e decantadores. Os ricos tons borgonha e marrom dos licores dentro das garrafas brilhavam fracamente na luz diminuta.

“Sobre o que?” perguntou uma voz vinda de uma das poltronas próximas à lareira. Collin Butler, Visconde de Galway, o único nobre do grupo, bebendo de sua própria taça, talvez um pouco mais do que seria aconselhável.

“Uma mulher. O que mais?” respondeu Christopher, tomando um gole mais modesto de sua taça.

“Ela finalmente descobriu sobre a sua cantora de ópera?” perguntou Collin, sorrindo maliciosamente. Ele tinha apresentado seu amigo à adorável Senhorita Montford.

James sorriu. Christopher fez uma careta. Aquela noite teve mais a ver com vinho do que com desejo, e ele ainda se arrependia dela.

“Sabem,” ele falou pausadamente, “vocês dois tiram muito assunto de uma única noite. Foi há oito meses. E de qualquer maneira, ela não realmente não valia o esforço. Não, não sobre ela.”

“Então sobre quem?” perguntou Collin.

Christopher revirou os olhos. “Ela quer me apresentar a uma jovem amiga dela. Receio que ela esteja bancando a casamenteira.”

“Oh, Senhor. Quem?” perguntou James, levando a taça à boca.

“Katerina Valentino.”

Collin ficou de boca aberta e James engasgou com o conhaque.

“O que?” quis saber ele. “Ela é horrível?”

“Não,” Collin respondeu cautelosamente, “ela é... poderosamente tímida.”

“Chata, na realidade,” juntou Cary, “Tentei dançar com ela uma vez. Senti-me mal por ela estar ali sozinha. Eu não acho que tenha visto os olhos dela uma vez durante a valsa, e se ela disse uma palavra, eu não ouvi.”

Aquilo não soava promissor. Christopher se jogou para trás contra o estofamento e olhou pela janela, absorvendo os detalhes que o cercavam, como ele sempre fazia. Na brilhante luz avermelhada do pôr do sol, os tijolos vermelhos da casinha do outro lado da rua de paralelepípedos parecia brilhar, a luz difusa pelas partículas de fuligem, que sempre ficavam pairando no ar. Numa cidade cuja população iria se aproximar dos seis milhões na próxima década ou pouco mais – com quase todas as casas com aquecimento a carvão – a poluição era inevitável. A adição da fuligem das fábricas a vapor só tornava tudo pior. O vicariato também era desconfortavelmente próximo ao Tâmisa. Esgoto bruto era jogado no rio há mil anos ou mais, e desde a metade do século, quando a Revolução Industrial começou na Inglaterra, poluentes das fábricas também eram despejados nele. O fedor do rio às vezes era avassalador, e viver perto dele certamente não era uma benção.

“Bem, eu disse a minha mãe que a conheceria, então vou aceitar a apresentação. Se ela não for nada, pelo menos eu posso dizer que tentei,” Christopher suspirou, resignado.

Cary bufou.

“Então, senhores, o que temos para ler hoje? Algo... intrigante?” perguntou ele, mudando de assunto. “Aquele ‘recentemente descoberto’ Byron?”

“Eu já o li. É uma fraude absoluta,” Cary dispensou com um aceno de sua taça. “Eu acho que parece um advogado em treinamento. Parecem documentos legais. Não, não. Eu tenho algo que nós nunca vimos antes.”

“O que é?” perguntou Christopher, se inclinando para a frente.

“O poeta se chama... Browning.”

“Elizabeth Barrett Browning?” Collin reclamou, “A poesia dela mal vale nosso tempo. Um monte de sonetos de garotas para ser usado em jovenzinhas suscetíveis. Não estou tentando atrair um de vocês.”

“Não, idiota,” Cary repreendeu o amigo com uma risada. “O marido dela. Robert Browning. Eu nunca li nenhum de seus trabalhos antes, mas o título promete.”

“E é?” pressionou Collin.

“O Amante de Porphyria,” anunciou James, levantando um folio da mesinha lateral e mostrando uma fina folha de papel impresso.

Christopher ergueu as sobrancelhas. “Realmente soa intrigante. Talvez ele seja o próximo Byron. Quem vai ler?”

“Eu leio,” Collin se voluntariou, tirando o folio das mãos de James. “‘A chuva chegou cedo esta noite/E o triste vento logo se levantou.’” Ele começou, e depois continuou a ler. Conforme ele progredia, James ergueu as sobrancelhas com prazer, conforme a jovem dama era descrita como parcialmente despida e aconchegada a seu amante. E então houve uma virada inesperada.

“‘Eu encontrei /Uma coisa a fazer, e todo o seu cabelo/em uma longa corda loira eu passei/ três vezes ao redor do seu pescocinho/E a estrangulei.’”

As sobrancelhas de James se juntaram, e Christopher cerrou os dentes para se impedir de ficar de queixo caído. Este não era um lascivo poema de amor. Collin olhou para o que tinha acabado de ler, mas continuou bravamente até o final, enquanto o assassino abraçava o cadáver da mulher que um dia o tinha amado. “‘E Deus ainda não disse uma palavra,’” concluiu Collin. Na última linha, os três jovens ficaram em silêncio. Era um poema terrivelmente violento.

“Bom Deus,” disse James por fim “Que diabos foi isso?”

“Não sei,” replicou Collin. “Eu nunca tinha ouvido nada como isso. Que... desagradável.”

Ambos olharam para Christopher. Ele também estava abalado pelo assunto em discussão, e ainda assim... um novo pensamento surgiu, tomou forma e cresceu.

“Eu acho que ele estava tentando mostrar um ponto ao invés de criar um poema bonito,” Christopher disse cautelosamente. “Falando sobre violência contra a mulher e tudo isso. Reforma social. Certamente coisas como essa acontecem.”

“Você o está defendendo?” A descrença de Collin era patente em sua voz. “É horrível. Mal rima. Vou voltar para Tennyson. Pelo menos ele é elegante. Além disso, qualquer garota burra o bastante para acreditar em tal louco merece o que recebe.”

“Talvez.” Os pensamentos de Christopher ainda estavam no poema.

“Eu acho que você tem falado muito com sua mãe,” riu Cary. A provocação crua trouxe a atenção de Christopher de volta ao presente. “É só um poema. Não fique procurando nada nele. Quanto a mim, já tive o bastante por uma noite. Devemos ir ao clube jantar?”

“Sim, acho que sim,” replicou Christopher, afastando o humor sombrio do poema. “Collin?”

“Sinto muito, estou sem dinheiro.”

“Eu pago para você,” ofereceu Christopher.

“Muito bem.”

E eles saíram, gratos porque no inverno, pelo menos, o fedor do rio era apagado pelo frio cortante.

Morte Roxa

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O Refúgio dos Anjos Negros

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